O uso contínuo, repetitivo e mecânico da língua tornam-na enfadonha, rotineira. O poema, ao contrário, faz-se por deslocamento da língua e acarreta no seu ponto ideal uma ruptura da monotonia em vários campos da realidade: arte, política, subjetividade, comportamento, gosto, moral. Na escrita poética, suspende-se o valor lógico-utilitário das coisas cotidianas e com ela transportamo-nos em movimentos de fruição e reflexão novos, inesperado, anteriores mesmo à compreensão, pois antes de “entendermos” os versos, sentimos que com eles uma parte de nós – antes sedimentada – lançou-se para uma zona de prazer e surpresa.
...a monotonia como um fato da linguagem. Ou, ainda, como uma patologia nascida das repetições, do ramerrão de fórmulas e clichês. Contra ela, textos – sobretudo em versos, estas pílulas superpotentes – capazes de avançar contra o ritualismo do tédio com uma linguagem fundada no deslocamento, na verticalidade e na pluralidade.
O sentido único é a máxima monotonia. Aquilo que a envenena é o nosso antídoto: textos que nunca descansarão na horizontalidade de uma significação estática e fazem ver inequivocamente a dimensão que os caracteriza: serem ilimitados...
A monotonia faz-nos sérios e aborrecidos.
Os poemas... têm espírito (palavra que nomeia a parte imaterial do humano que é ao mesmo tempo a alma, a inteligência, o afeto, o brilho, ou ainda o ânimo para um posicionamento inesperado da linguagem, capaz de seqüestrar o desgosto, a náusea)...
Veneno antimonotonia: designação genérica para aquilo que o verso traz vivo – beleza, rebelião, humor, delicadeza, espanto, entusiasmo, delírio, construção.
Canções e poemas, numa vizinhança harmoniosa, são os antídotos contra o vazio, o medo, a falta de imaginação. O verso se aproxima das coisas banais, para dar prazer, fazer bem, reunir, divertir. E assim nos convida – que a gente peça mais e mais, que corra riscos, que vença o tédio.
(Cristiano)
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